Avô Armando.


Domingo passado fez-se Outono e o meu coração ganiu de dor.
Sete dias volvidos, as ruas arrogam-se o privilégio de ser as mesmas mas eu sei que nada continuará igual. Ainda ouço o eco dos teus passos, firmeza cantada do teu sempre distinto porte. Sempre foste um Senhor e isso sempre fez toda a diferença.
Cheguei pequena para te amolecer o coração, esse que ainda julgavam à prova de tudo. Troquei-te as voltas quando me pegaste ao colo e ensinaste a regar o jardim e sei que te fiz sorrir quando te segui os passos. Colega, chamavas-me tu com orgulho. E eu encantada, consciente da grandeza que nos separava o saber.
Ainda não sei como vou aprender a entrar em tua casa sem te ver na copa a tratar dos queijos, no canto da sala de jantar a trabalhar ou tao só no escritório a ver televisão. Melancólica a ausência das presenças que em nós existem desde sempre. E eu que ia fingindo acreditar no impossível perpetuar de uma vida já tão longa, como se nada te pudesse levar para longe de mim.
Os meus metros quadrados de mundo choram agora com saudade, com o coração a transbordar de coisas por te dizer. Tinhas em ti um mundo de histórias que temo por vezes terem ficado por contar. Queria ter-te abraçado mais, ter partilhado mais desses teus risos cantados em tom de criança, tão puros que pareciam fazer troça da própria felicidade. Queria ter-te dito mais vezes o quanto me orgulhava de ti, sem ter deixado o egoísmo dos dias me toldar a existência.
Resta-me o consolo de me teres amado com carinho até ao último domingo, dia em que, cansado, te quiseste fazer o Outono que já tardava a chegar. E eu que tanto gosto da singela e serena beleza do Outono, não posso se não recordar-te neste dourado que agora nos brinda os dias que correm suaves por entre o barulho das folhas secas.
Que bom é saber-te Avô, agora tão bem acompanhado. O meu coração, que já ai estava em cima, permanece agora no teu amor. Gosto tanto de ti.
Um até já da tua colega,
Sofia
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