Acorda-me quando chegares.



Há um jeito tão teu que me deixa tonta, como quando ando perdida, às voltas, naquela curva que faz o teu corpo quando liga o teu pescoço ao ombros. Nessa vertigem sobe-me o sangue à cabeça e fico com vontade de te agarrar e levar para Alijó, ainda que nem saiba onde isso fica. Achar-me-ás pateta, bem o sei, mas tinha de to dizer.
São nano segundos de incontida emoção que me salta pelos olhos e me enche em demasia o coração que fica a transbordar de amor por ti e de uma vontade imbatível de te acarinhar. Como se fosses frágil, de uma fragilidade frugal e diferente da que nos é inerente. Mas depois levantas-me no ar de uma penada e esqueço essa ideia, que me sinto protegida da minha própria fragilidade quando estou nos teus braços.
Dizia eu, antes de me interromper – o que acontece amiúde – que há um jeito tão teu que me deixa tonta. Dou por mim a rever-te em câmara lenta numa tentativa honesta de tentar congelar o tempo, esse grande sacana. No outro dia estava eu nisso, quando me perdi no supermercado. Não rias, é sério. Uma sombra imensa num corredor sem fim ladeado por brócolos, como se fossem árvores imponentes e estivéssemos naquela estrada em Barcelos. E eu que só pensava em lá ir fora, acabei bem lá para dentro, a ter de pedir indicações ao senhor do talho que me dizia, perplexo, para não me assustar, que a saída era já ali ao lado. Chamou-me menina e eu acreditei e permiti-me sorrir.
Quando saí respirei fundo e liguei-te. Estavas sentado à mesa, entretido com umas cerejas que sabem a cerejas, trazidas em caixas da Gardunha. E eu que não sei comer cerejas e acabo sempre com os dedos pintados e a boca toda suja a adivinhar pelo canto do olho o teu sorriso malandro a fazer pouco de mim. Fui directa a ti, que te decorei o caminho e sim, também te decorei a caminho. Apaziguas-me sempre o espírito, como se tivesses um dom maior do que tu, do que nós, que te permitisse dividir serenidade por aí. Faço do teu sorriso uma casa e do teu abraço um destino. E é sempre assim que me encontro de cada vez que, tonta ou distraída, me deixo perder. E ainda me espanta que não percebas porque é que te agradeço esse teu trabalho vigilante que exibes com carinho e ainda dizes, no fim, que o gosto é todo teu. Quando é claro que não é, que me delicio sem vergonha até não mais poder.
E hoje, hoje a rua cheira a calor e eu só me consigo lembrar desse jeito tão teu. Que me deixa tonta. Mais do que aquilo que sou. Sem perder o equilíbrio, é bom de ver. E hoje, hoje não posso ir directa a ti, que não estás, resta-me esperar que voltes e que faças barulho ao chegar, que eu não quero dormir enquanto não estiveres.



* D.
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