Era uma vez um jacaré.


Chegados a Porto Amélia, no meio de um calor bafiento e húmido, foram recebidos por um sorridente e desdentado Inocêncio, de pés descalços e pouco mais de um metro e meio de altura.
Inocêncio recebeu-os com a aprazível familiaridade de quem raramente recebe alguém mas que, talvez por isso, tem uma vontade imensa de o fazer e teve já tempo suficiente para discorrer sobre o mais ínfimo detalhe.
Os chapéus que traziam, de palha, faziam mais calor do que a eventual sombra que pudessem proporcionar. Vinham vestidos de linho branco, uma espécie de protocolo mudo que morava no seu imaginário. Ele não largava a sua maleta de médico, por estrear, castanha, repleta de promessas diagnosticadas e esperança que enchia uma série de pequenos frascos de plástico. Ela, cuja pose de senhora delicada escondia qualquer temor que a pudesse possuir, agarrava-se a ele com força, como se nele jazesse o tratamento mais eficaz para qualquer mal que a pudesse assolar.
Depois de subirem um carreiro estreito, pó levantado a cada passo, Inocêncio parou e apontou para a casa onde iriam passar os próximos anos da sua vida – Deus o permitisse!
E então disse, em tom prazenteiro e descontraído:
“- Tem um jacaré pequeno dentro da banheira. Está a crescer para depois poder fazer uma mala para a sua senhora.”
E foi aí, ainda incrédulos, num eco surrealista, que souberam que seriam felizes.



Para o Avô da minha amiga Inês, o Avô 'Quim, por nos contar histórias tão deliciosas de um passado tão fascinante.

* Bisavó Adelaide, Mãe, Tio Titita, Tio Luís, Tia Ana e Tio Francisco.
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