Como no cinema.


Se me perguntassem diria que cheira a 1987.
Debaixo daquela luz difusa jazem túmulos de pensamentos calados, de emoções contidas e guardadas baixinho. Não são cadeiras, antes caixas de reflexão. They don’t kiss and tell.
Vêm a descer devagarinho, a pensar em cada passo. Sentam-se cinco filas à frente. Ela primeiro, sob o olhar atento dele, que lhe endireita o casaco nas costas, para a proteger de qualquer brisa imaginária que por ali ousasse correr. Devagar, com tempo, um gesto doce. Tão doce quanto os olhares que trocam, cúmplices, forjados numa vida partilhada que também se faz em silêncio. Ainda que não sejam olhares novos, não estão cansados. Apenas se reconhecem, mesmo no escuro.
É tudo feito em câmara lenta, pelo menos no meu cérebro, que, encantado, quer reter tudo.
Solto um suspiro.
Quando o filme acaba dou por mim a pensar que aquela foi a cena mais deliciosa, que não há tela maior do que a vida.

 
 
* Ana.
** Edição de fotografia: Paulo Silva.
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