À memória. Que perdura.


Não há memória de avó assim.
Confesso que não era igual à dos livros de histórias que sempre me fizeram as delícias de criança.
Sempre foi mais velha, mas nunca foi velhinha.
Não bordava numa cadeira de baloiço em frente à lareira, nem cozinhava deliciosos bolos saborosos e fumegantes.
O cabelo sempre o conheci branco, mas na boca e nas unhas bailava sempre um toque de encarnado tom de amor, que mais tarde foi sendo substituído por um mais discreto e suave tom de mel misturado com avelãs.
Nos olhos, brincava sempre um sorriso de criança, pintado com uns laivos esverdeados que nos protelavam o olhar.
As mãos, esguias e bonitas, podiam ter sido de um pianista, quem sabe um cirurgião.
Mas não, ainda mais nobre e melodiosa era a sua profissão. Avó.
A magia de ser mãe a dobrar. Mãe dos filhos e dos filhos dos filhos. Que alegria.
Quanto trabalho…árdua tarefa desempenhada na perfeição. Com pose de senhora, daquelas que temo em vias de extinção, com classe e educação, daquela que sempre nos tentou incutir.
Cúmplice do verbo “dar”, dava tudo o que podia. Com gosto, e aquele sorriso sempre aberto a pairar na sua cara.
Firme, sobreviveu a uma série de tormentas e agruras que a vida, maldosa, lhe tinha reservado. O sorriso, esse, não desaparecia. Era lugar seguro. Porto de abrigo para quem quer que ali pousasse.
Lembro-me de pensar que talvez soluçasse para dentro.
Para fora transbordava o carinho em que tão bem sabia transformar as tristezas.



Porque foi há 6 meses. O tempo voa, a saudade molenga.



Soundtrack: Bach - Variações de goldberg.
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